sábado, 16 de janeiro de 2016

Shandong





Chateau Changyu, com sua imponente sede.


            O objetivo de “O Mundo e o Vinho” é apresentar as mais diversas regiões vinícolas do planeta. Por aqui, até o momento, passaram regiões consagradas (Vale do Rhône), desconhecidas (Utiel-Requeña) e populares, em âmbito nacional (Serra Gaúcha). No entanto, mesmo no caso de Utiel-Requeña, trata-se de uma região desconhecida em um país conhecido pela produção de vinhos de qualidade (no caso, a Espanha).

            Há locais, no entanto, em que mesmo o país onde está inserido não desfruta de qualquer prestígio ou renome. Seja pelo seu potencial econômico, seja pelo crescente interesse nacional e internacional em explorar seus possíveis terroirs, seja pelo entusiasmado e relativamente repentino interesse de sua população na bebida, porém, merece atenção e reconhecimento pelo que vêm sendo ali produzido. Um destes locais é a província de Shandong, localizada na... China.



Sua História



Vinícola Treaty Port.
  


            A região onde localiza-se a atual província de Shandong foi o lar de diversas culturas neolíticas, entre 6.500 A.C. e 1.500 A.C. Quando do surgimento das primeiras dinastias (Shang e Zhou), estas exerceram poder na parte ocidental da região; a porção oriental era dominada pelos povos conhecidos como “Dongyi”, considerados bárbaros. Nos séculos seguintes, estes últimos acabaram submetidos pelos primeiros. Datam deste período (cerca de 4.600 A.C.) os primeiros registros de bebidas produzidas a partir da uva, que podem ser consideradas “vinhos”.
            

            Entre os séculos VIII e V A.C., a região abrigava dois estados principais: Qi e Lu. Este último é conhecido por ser o berço de Confúcio. Porém, este acabou sucumbindo e caiu sob domínio do grande estado de Chu, ao sul. Qi, por sua vez, foi conquistada pela dinastia Qin, que fundou o primeiro Estado chinês em 221 A.C. Após diversas invasões e conquistas da região por vários povos, em 1142 a dinastia Song foi obrigada a ceder o norte da China à dinastia Jurchen Jin. Esta dividiu a região novamente em Shandong Oriental e Shandong Ocidental: foi a primeira vez que houve a utilização do seu atual nome. No entanto, a moderna província de Shandong, em composição e dimensão aproximadas da atual, surgiu durante a dinastia Ming. Em 1644, seu atual território estava praticamente definido. Por volta desta época, o consumo de vinho quase desapareceu da região e da China como um todo, com o surgimento de bebidas alcoólicas produzidas à base de sorgo, milho, arroz e frutas.



Trecho de "A Canção da Uva" (葡萄 ), por Liu Yuxi (772-842)


Nós homens de Tsin, somos como as melhores uvas

As cultivamos como as jóias mais raras;

美酒 
Deste delicioso vinho que produzimos,

令人 不足  
Para cada homem que nunca pôde saciar sua sede

爲君  
Tome uma dose deste vinho

涼州
E Liangzhou certamenta será sua.



            No decorrer do século XIX, a influência ocidental sobre a China tornara-se evidente, e Shandong, localizada próxima à costa, seria especialmente afetada pelo “fenômeno”, tendo tornado-se zona de influência inglesa e, especialmente, alemã nesta época (leia-se por zona de influência o “aluguel” destas regiões para os países citados). Situação que perdurou até o término da Primeira Guerra Mundial, quando as zonas de influência da Alemanha derrotada passaram para o Japão, ao invés da restauração da soberania chinesa. Houve diversos protestos e revoltas e, até 1930, Shandong seria retomada pela China. Com o advento da Segunda Guerra Mundial e invasão japonesa ao território continental chinês, Shandong passaria ao domínio daquele, que adotou a política da “terra queimada” até a expulsão de suas tropas em 1945.

            Nos últimos anos, a China, e Shandong em especial, têm desfrutado de grande desenvolvimento econômico. Hoje é uma das províncias mais ricas de toda a China, e um de seus orgulhos é a florescente indústria vinícola. Sua origem, porém, encontra-se fora dos limites da província, remontando a 1980; quando do início de uma profunda reforma econômica no país, a empresa francesa Rémy Martin estabeleceu uma joint-venture em Tianjin: a Dinasty (Wang Chao) Wine Ltd. Seus mais de 90 produtos ganharam reputação nacional e internacional. Tais produtos (somente bebidas alcoólicas, diga-se), porém, possuiam preços proibitivos para a população de baixa renda, destinando-se quase exclusivamente à exportação. Situação que perdurou até o início dos anos 2000, com o “boom” econômico vivido pela China: a partir de então, boa parte da população possuía meios para adquirir os vinhos ali produzidos. Em 2005, 90% do vinho produzido na China destinava-se ao mercado interno. Também verificou-se um aumento exponencial do interesse pelo chinês quanto ao produto importado, francês em especial. É notório e conhecido o entusiasmo (para não dizer obsessão) do chinês pelos vinhos das melhores AOCs da França, em especial Bordeaux. Os grandes investidores, inclusive, tem realizado parcerias, injetado recursos ou mesmo comprado diversos chateaux, nos últimos anos.




Vinho tinto e vinho branco da produtora Dinasty.



            No entanto, tão ou mais interessante quanto este fato, é o fato de que a China, aos poucos, emerge como potencial player no cenário mundial da indústria vinícola. Vinhos chineses começaram a surgir nas prateleiras norte-americanas. Em 2011, no Decanter World Wine Awards, o vinho Jia Bei Lan 2009 Cabernet, produzido pela vinícola He Lan Qing Xue, venceu competidores franceses, argentinos, australianos, americanos e sul-africanos na categoria “Bordeaux varietal tinto acima de 10 Libras”, o que contribuiu enormemente para a aquisição de prestígio do produto nacional, bem como incentivo aos produtores locais.



Cidade de Jinan, capital da província de Shandong.


            Com a exigência do público chinês por produtos melhores e de maior valor agregado, e como que preparando-se para um possível “boom” de consumo de vinhos chineses em outras regiões do mundo, as regiões vinícolas vem procurando extrair o máximo de seus solos, das condições climáticas e incrementando seus métodos de produção. E, certamente, a região de Shandong, conforme veremos adiante, oferece, dada a sua localização geográfica, o maior potencial do país para produção de vinhos de padrão internacional.    
           



Sua Localização



Localização de Shandong.


            A província de Shandong localiza-se a leste no território chinês, limitada pelo Mar Amarelo, e bastante próxima a península da Coréia. Sua capital é a cidade de Jinan, com cerca de 2,5 milhóes de habitantes. Possui uma população estimada de 95 milhões de habitantes. Trata-se de uma península, a qual abriga o baixo estuário do Rio Amarelo (Huang-Ho).

            Shandong, em chinês, significa “Montes Orientais”: deve seu nome à localização, a leste das montanhas Taihang.




Montanhas Taihang.



Seu Clima e Solo

            O macroclima da região de Shandong é marítimo. A província sente os efeitos das monções do leste asiático, o que garante a vinda de ventos frios do Oceano Pacífico para suas costas, ocasionando chuvas intensas no período do verão, o que incorre em alta incidência de doenças fúngicas no período entre esta estação e o outono. A maioria dos vinhedos encontra-se em encostas voltadas ao sul, o que garante uma melhor drenagem do fluxo excessivo de água. Curiosidade: a região encontra-se na mesma latitude de Bordeaux, na França.

            O solo é composto de uma mistura de cascalho e argila, muito rica em cálcio e minerais. Como possui uma retenção ideal de água, resulta em níveis muito bons de açúcar nas bagas e potencial para vinhos com teor mais alto de álcool.


           

Suas Sub-Regiões

            Uma vez que a China ainda não possui um sistema semelhante às DOCs francesas, italianas e portuguesas, suas províncias acabam por tornando-se as denominações existentes, porém sem nenhuma legislação específica que regule e controle a produção. Assim sendo, Shandong é uma das regiões, não possuindo sub-regiões com regulamentação distintiva da principal.

           


Suas Castas

            Em Shandong são comumente plantadas as cepas clássicas européias, com destaque para as brancas Chardonnay e Riesling, e as tintas Cabernet Sauvignon, Merlot e Cabernet Gernischt.




Cabernet Gernischt. Ou, se preferir, Carmenère.



            Introduzida no país em 1892, a Cabernet Gernschit é uma cepa francesa que não resistiu à praga da filoxera no mesmo século e, portanto, acreditava-se estar extinta do continente europeu. De características muito próximas à de sua descendente direta Cabernet Franc, recentes testes de DNA comprovaram que a cepa é ninguém mais, ninguém menos do que a “chilena” Carmenère, também extinta da Europa na mesma época da devastação da filoxera.

            As videiras encontram-se com idade aproximada de 20 anos, considerada o “auge” para as cepas supracitadas.




Seus Principais Produtores


            Seguem nomes de alguns dos mais renomados produtores da Shandong:
           
  • Changyu Pioneer Wine Co.
  • China Great Wall Wine Co. Ltd.
  • Yanbin;
  • Treaty Port;
  • Chateau Junding;
  • Golden Crete;
  • Hualu Winery;
  • Malina;
  • Maykama;
  • Qingdao Great River Hill;
  • Wisno Charles;
  • Yantai Central;
  • Yantai Nanshan Manor;
  • Yantai Penglaige;
  • Yantai Sanye;
  • Yantai Tonsing;
  • Chateau Reifeng-Auzias;
  • Yantai Weilong;
  • Zhengda;
  • Chateau Changyu.



Chateau Junding.



Vinho Degustado

            Infelizmente o blog não conseguiu obter ou degustar um rótulo de Shandong para avaliação. No entanto, estamos nos esforçando para trazer um bom produto desta região e, assim que conseguirmos, realizaremos sua avaliação, em um post novo e atualizando este. Pedimos desculpas.






Fontes:

Daily Mail (I'll have a bottle of castle Shandong 2010: The story behind China's wine revolution):

Chinese wine wins top honour at Decanter World Wine Awards:

Wikipedia:


2 comentários:

  1. Muito bom nem imagina vinhos chineses rd

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    1. O mundo é surpreendente. Em breve, mais regiões "inusitadas". Saúde, e bons vinhos!

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