Vinhedo próximo a
Blenheim, maior cidade da região de Marlborough.
O
verão. Época adorada por muitos brasileiros, pelo calor, pela coincidência com
o período de férias escolares, pelo Carnaval, pela possibilidade de aproveitar
os dias próximos às suas belas praias...
O
Brasil é um dos maiores consumidores absolutos de bebidas alcoólicas, sendo
que, dentre estas bebidas, reina a cerveja, dado o seu preço acessível e o grau
de penetração das megacervejarias país afora. Consumo este que, em períodos
quentes como o verão, aumenta substancialmente. O vinho, dentro do contexto
sociocultural brasileiro, ainda possui uma certa aura premium, o que dificulta uma maior presença nas mesas nacionais (exceto pelos espumantes, este com
aceitação um pouco mais ampla). Além destes, certamente o vinho branco é um dos
que apresenta maiores possibilidades de “conquista de terreno”, tendo como
possível e provável carro-chefe os refrescantes e ácidos varietais da cepa
francesa Sauvignon Blanc: o Chile já descobriu seu potencial, produzindo ótimos
vinhos. Um mercado a ser melhor explorado.
Esta é a
faceta mais conhecida da Sauvignon Blanc. Há outras, porém, relativamente pouco
conhecidas no Brasil, as quais demonstram sua versatilidade e “poder”. Além de
sua terra-natal, uma região muito distante consegue extrair talvez os
exemplares mais poderosos e opulentos desta cepa: a região de Marlborough, na
Nova Zelândia.
Sua História
Não se sabe exatamente quando a
ocupação humana iniciou-se na região de Marlborough: acredita-se que no início
do século XII os maoris (aborígenes nativos) tenham-se instalado na parte
costeira da região, próximos à atual cidade de Blenheim. Viviam do extrativismo
da vida marinha e da agricultura, sobretudo do cultivo da kumara (batata doce).
Gravura européia do
século XVII contendo as primeiras impressões acerca dos maoris.
Após uma
passagem rápida pelo explorador inglês Abel Tasman pelas ilhas neozelandesas em
1642, estes retornaram à região em 1769, quando o também explorador inglês
James Cook mapeou quase todo o litoral do atual país. Após o início da efetiva
colonização do território, foi realizada a divisão da ilha em províncias, no
ano de 1853. Marlborough, à época, era parte integrante da província de Nelson
e, após diversas reivindicações de seus colonos, obteve sua separação em 1859.
Nas três décadas seguintes, a descoberta de ouro na região levou a um breve
período de boom desenvolvimentista e
expansionista da região; porém, foi a introdução da pecuária (ovinos) na região
quem garantiu a estabilidade econômica a longo prazo, transformando o local em
um dos dois principais criadouros do país (ao lado de Canterbury).
Criação de ovinos em
Marlborough.
Desde a sua
colonização até o início dos anos 1970, a cultura da uva na região privilegiava o
plantio das variedades americanas, resultando em produtos modestos, dado o
potencial do local. Em 1836, foi criada a New Zealand Temperance Society, que,
em termos práticos, combateu o consumo de bebida alcoólica de forma análoga ao
ocorrido nos EUA quase 100 anos depois. Some-se a este estado de coisas o fato
de a filoxera ter chegado ao país por volta de 1895, e o que se viu foi a
predominância do plantio de cepas americanas, imunes à praga.
Freeth’s Wine Cellar,
1899.
No entanto, logo o potencial da
região e do país como um todo seria devidamente explorado: a Vitis Vinifera fora introduzida, houve
um rearranjo dos produtores ao longo da década, e a área cultivada sofreu forte
redução de mais de 25%.
Plantio de Sauvignon
Blanc, anos 1970.
A região de Malrlborough logo
descobriria uma cepa com potencial enorme em seu terroir, a qual geraria vinhos de enorme qualidade e consolidaria a
fama de todo o país entre os produtores em nível global: seus varietais da cepa
branca Sauvignon Blanc tomaram de assalto o mundo vinícola a partir dos anos
1980, conquistando distinções internacionais, o que tornou os grandes vinhos
locais desta casta incrivelmente caros. Atualmente a região goza de grande
prestígio, produzindo rótulos de diversas cepas e diversos valores (tendo como
referências seus Pinot Gris, Rieslings, Pinot Noirs, Chardonnays e, em menor
escala, cepas tintas francesas), porém sempre reputando pela sua ótima
qualidade e tendo a Sauvignon Blanc como seu carro-chefe.
Sua Localização
Localização do
distrito de Marlborough (em vermelho) no território neozelandês.
Marlborough
localiza-se na ilha sul do arquipélago da Nova Zelândia, em sua extremidade
setentrional, sendo delimitada ao norte pelo Estreito de Cook, ao sul pelo
distrito de Canterbury, a oeste pelo distrito de Nelson (do qual se emancipou
em 1859) e a leste pelo Oceano Pacífico. Sua maior e mais importante cidade é
Blenheim, com cerca de 31.000 habitantes.
Mapa de Marlborough.
Seu Clima e Solo
Marlborough possui em torno de 62%
dos vinhedos neozelandeses. O clima da região é oceânico, marítimo, com grandes
variações de temperatura: alta incidência solar durante o dia e noites bastante
frescas. A neblina típica das manhãs auxilia a proteção das vinhas perante o
sol incessante. Com isso, os níveis de acidez conseguem ser mantidos em níveis
bem altos. Em sua costa oriental, as brisas marítimas, em conjunto com a
proteção concedida pelas cadeias de montanhas ali existentes, favorecem a
formação de um clima ameno e protegido de excesso de chuvas.
O solo da região é predominantemente
antigo, profundo, pedregoso e de boa drenagem. A bacia hidrográfica da região,
por sua vez, contribuiu para a formação também de bolsões de solos areno-pedregosos,
assentado sobre uma camada profunda de cascalho. Ao sul, a argila aparece com
mais freqüência, o que favorece, em conjunto com o clima, a produção de tintos
da cepa Pinot Noir.
Suas Sub-Regiões
Vinícola Rippon.
Marlborough
é dividida essencialmente em 3 sub-regiões, a saber:
- Southern
Valleys: no centro de Marlborough, apresenta solo essencialmente de argila
e clima frio e seco. Diversas cepas cultivadas, com destaque para a Pinot Noir;
- Wairau
Valley: mais setentrional, esta sub-região apresenta diversos mesoclimas,
desde locais mais secos e frios ao interior até regiões mais frescas,
beneficiadas pelas brisas marítimas. Também apresenta diversidade de solos,
desde o cascalho e aluvião próximo aos rios como também solos pedregosos e
relativamente estéreis. Própria para a produção de vinhos com caráter mais
jovem, frutados e encorpados; e
- Awatere
Valley: ao sul de Wairau, trata-se da sub-região mais bem delineada. De
clima frio e seco, e de relevo bastante acidentado, suas vinhas são de
rendimento baixo, o que dá origem a excepcionais tintos varietais da cepa Pinot
Noir, bem como Sauvignon Blancs de renome internacional.
Suas Castas
Há um
implícito conceito de que Marlborough (e a Nova Zelândia, como um todo) possui
um clima semelhante ao da Borgonha, na França e, portanto, as uvas melhores
adaptadas a climas mais frios dão origem aos seus melhores vinhos. Não deixa de
ser uma verdade parcial: realmente, cepas típicas daquela região francesa
encontraram terreno muito propício por aqui, como a branca Chardonnay e a tinta
Pinot Noir. No entanto, sem dúvida alguma a cepa mais bem-sucedida na região
apresentou um nível de versatilidade que transcende o tipo de clima existente
no leste francês.
Originária
da região francesa de Bordeaux, onde são produzidos rótulos primorosos, e
posteriormente plantada no francês Vale do Loire, a partir de onde atingiu
reputação mundial, a cepa branca Sauvignon Blanc encontrou no macroclima
marítimo de Marlborough e em seus solos a condição ideal para exprimir em forma
de vinho uma grande mineralidade em seus aromas e sabores, algo que vagamente
remete aos grandes vinhos brancos alemães, à base da cepa Riesling. Em outras
regiões do mundo, como no Chile (Vale de Casablanca) e em San Rafael (Argentina),
seus aromas estão muito mais próximos de frutas carnosas, como maçã ou pêra,
diferentemente do Vale do Loire, onde aparecem, além da alta acidez, um caráter
defumado que pode ser chamado de “marca registrada” desta região.
Sauvignon Blanc.
Apesar de
relativamente versátil, embora haja clara preferência por climas mais frescos,
a Sauvignon Blanc não se adapta bem a climas quentes. O que não ocorre quanto
ao tipo de solo: do calcário ao pedregoso, passando pelos argilosos, a
Sauvignon Blanc exprime caráter diferente, porém nunca desagradáveis.
A Sauvignon
Blanc, através de cruzamento com a cepa tinta Cabernet Franc, deu origem à
também tinta Cabernet Sauvignon. Atravessou a fronteira de sua terra natal pela
primeira vez em 1880, chegando à Califórnia: as mudas vieram diretamente do
Chateau d’Yquem, produtor dos mais caros (e provavelmente os melhores) vinhos
de sobremesa do mundo. Chegaria à Nova Zelândia no século XX, onde atualmente
responde por 17.000 há de área cultivada: para se ter uma noção da hegemonia
desta cepa na região, a Pinot Noir, segunda cepa mais cultivada em Marlborough,
ocupa somente 2.000 há de área cultivada!
Além das 3
cepas citadas acima, também possuem relevância os vinhedos das cepas brancas
Pinot Gris, Riesling, Gewürztraminer e Viognier; há discretas plantações das
cepas tintas Syrah e Tempranillo.
Seus Principais Produtores
Seguem
nomes de alguns dos mais renomados produtores de Marlborough:
- Allan
Scott;
- Astrolabe;
- Ata
Rangi;
- Auntsfield;
- Awatere
River Wine Company;
- Barkers
Marque;
- Bladen
Wines;
- Blind
River;
- Bouldevines;
- Brancott
Estate;
- Catalina
Sounds;
- Charles
Wiffen Wines;
- Churton;
- Clark
Estate;
- Clifford
Bay;
- Clos
Henri;
- Cós
Marquerite;
- Cloudy
Bay;
- Crowded
House;
- Darling
Wines;
- Dog
Point Vineyard;
- Fairbourne
Estate;
- Folium
Vineyard;
- Forrest
Estate;
- Foxes
Island Wines;
- Framingham
Wines;
- Fromm
Winery;
- Drylands
Wines;
- Eradus
Wines;
- Georges
Michel Wine Estate;
- Gibson
Bridge;
- Giesen
Wines;
- Herzog
Estate;
- Harwood
Hall;
- Highfield;
- Huia
Vineyard;
- Hunters
Wines;
- Isabel
Vineyards;
- Jackson
Estate;
- Johanneshof
Cellars;
- Jules
Taylor Wines;
- Konrad
Wines;
- Lake
Chalice Wines;
- Lawson’s
Dry Hills;
- Marisco
Vineyards;
- Maven
Wines;
- Mount
Fishtail;
- Mount
Riley;
- Mud
House;
- Nautilus
Estate;
- Omaka
Springs Estate;
- Opawa
Wines;
- Oyster
Bay Wines;
- Red
Deer Wine;
- Ribbon;
- Summerhouse
Wines;
- Rock
Ferry Wines;
- Saint
Clair;
- Sileni
Estates;
- Southbank
Estate;
- Stanley
Estate;
- Tupari
Wines;
- Vavasour
Wines;
- Villa
Maria Estate;
- Whitehaven;
- Yealands
Estate;
- Staete
Landt;
- Two
Rivers;
- Wairau
River Wines.
Vinho
Degustado: Peter Yealands Pinot Gris 2013 (Awatere Valley ,
Marlborough)
A Yealands
Estate é uma premiada vinícola neozelandesa que prima pela produção sustentável
de vinho. Premiada em 2014 como a “Vinícola do Ano” no país. Criada em 2008
pelo polivalente Peter Yealands, ele já realizou de tudo um pouco na vida: foi
tosador de ovelhas, montou uma empresa de construção civil, foi um dos
pioneiros em seu país na indústria de mexilhões e, desde 2008, trabalha com
vinhos. Seus produtos vêm gradativamente ganhando prêmios nacionais e
internacionais.
O rótulo
avaliado é um varietal da cepa branca Pinot Gris, uma das castas mais
bem-sucedidas no país, e foi merecedor de elogios da crítica especializada do
país, quando do lançamento. Ao vinho:
Análise Visual
Visual límpido, baixa intensidade,
borda incolor, núcleo amarelo palha;
Análise Olfativa
Aroma de média intensidade,
primário, de nozes, pêra, fruta de caroço e algo de mel;
Análise Gustativa
Seco, de média acidez, sabor de média
intensidade de mel e fruta , corpo médio, álcool médio para alto, persistência
boa.
Considerações Finais
Elegante, equilibrado, com certo
dulçor. Boa companhia para carne suína magra e peixes oleosos, bem como peru e
faisão assados.
Pontuação: 89 FRP
Fontes:
Revista Adega:
Adoro oa vinhos produzidos na Nova Zelândia
ResponderExcluirEsse Pinot Noir da Peter Yealands eu considerei horroroso! Nada a ver com a complexidade e a sofisticação dos PN's borguinhões. Cheiro desagradável, no paladar, lembra um vinho chileno de baixa procedência, com sabor difuso e sem nenhuma personalidade. Recomendo passar bem longe!
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