Chateaux.
Domaines. Tenuttas. Quintas. Bodegas. Weinguts. As denominações são várias,
mas todas são utilizadas para designar propriedades produtoras de vinho, em
geral localizadas no continente europeu. São construções quase sempre
centenárias, algumas com participação na história de seus países, ou
pertencentes à personalidades reputadas em algum momento de sua existência.
Porém é possível encontrar muita história também nas propriedades distantes do
Velho Mundo: algumas, decisivas para a independência de sua própria nação. Caso
da vinícola Santa Rita.
O Produtor
Vinhedo de Cabernet Franc, Viña
Santa Rita, Valle do Maipo, Chile.
A
história da Viña Santa Rita remonta antes mesmo de sua efetiva fundação, em
1880. Antes uma propriedade agrícola chamada “Hacienda de Paine”, era
administrada por Paula Jaraquemada, no início do século XIX.
Paula Jaraquemada.
Os países latino-americanos viviam
os conturbados dias que precederiam à sua independência, e a luta no Chile foi
bastante encarniçada. Iniciado em 1810, o movimento aproveitou-se do momento
tumultado de sua metrópole – a Espanha – que vivia sua “Guerra Peninsular”,
tentando libertar-se do jugo de Napoleão Bonaparte, que governava o país
através do seu irmão José. No entanto, por volta de 1814, a Espanha já havia
restabelecido sua autonomia, e retomara a luta pelo controle de suas colônias.
Quadro retratando
batalha ocorrida na “Guerra Peninsular”, ocorrida entre 1807 e 1814.
Em 1814, um grupo de soldados do
movimento de independência, após a Batalha de Rancágua, procurou abrigo e
refúgio na Hacienda de Paine. Paula, defensora do movimento e ciente da
proximidade dos espanhóis, protegeu os 120 soldados no porão da sede da
fazenda, salvando suas vidas. Não à toa, uma das principais linhas da Santa
Rita é o rótulo 120, em alusão aos soldados.
Ilustração do início
do século XIX representando Paula Jaraquemada sendo interrogada por soldados da
Coroa Espanhola, em busca dos 120 soldados pró-independência.
Análise Visual:
A
independência do Chile foi obtida em 1818, e a “Hacienda” viveu dias tranquilos
a partir de então. Os anos se passaram e, em paralelo, no ano de 1880, o
empresário chileno Domingos Fernández Concha fundara a Viña Santa Rita; enófilo
convicto, deu início ao cultivo de cepas viníferas internacionais na região,
próxima à Hacienda de Paine. Naturalmente, o Chile é um país bastante
afortunado: possui proteções em seus limites contra pragas como a filoxera –
pulgão que provocara enorme devastação nas vinhas ao redor do mundo, àquela
época – possui a Cordilheira dos Andes como fonte de água puríssima para o
ciclo de vida da videira, bem como diversos microclimas, muitos semelhantes aos
europeus. Para Domingos, no entanto, isso não era suficiente: trouxe enólogos
renomados e utilizou técnicas ainda incomuns para o plantio e vinificação no
país. O resultado foram vinhos que possuiam qualidade superior aos demais
produtos chilenos.
Domingo Fernández Concha (1838-1910), fundador da vinícola.
Durante
o século XX, a vinícola mantivera boa reputação nacional e internacional, porém
era necessário dar um passo adiante: as técnicas de viticultura e vinificação,
os estudos sobre o clima e solo tornaram-se muito importantes. A vinícola, que
primara pelo pioneirismo em técnicas no século anterior, estava apoiada em
bases e uma filosofia bastante tradicional. O passo foi dado somente em 1980:
uma joint-venture entre o grupo chileno Claro e a estadunidense Owens
Illinois adquirira a vinícola, e iniciou uma revolução em seus processos produtivos.
A partir de 1985, aumenta expressivamente a participação da vinícola no mercado
internacional e, dois anos depois, adquire a marca Carmen, de grande prestígio.
O
impulso dado pelo maior volume de exportações e o reconhecimento da crítica
especializada à qualidade dos vinhos permitiu à Viña Santa Rita ampliar seus
vinhedos pelas diversas regiões do Chile, muitas ainda a serem exploradas,
naquela época: surgiram vinhos produzidos no Valle do Rapel, Casablanca e Apalta,
entre outras regiões. Em meados dos anos 1990, Ricardo Claro Valdés, então
único proprietário da vinícola – o grupo Owens Illinois deixara o negócio –
adquirira a antiga Hacienda de Paine – rebatizada de Hacienda Santa Rita, que
tornaria-se a principal sede da vinícola, berço dos principais rótulos da Santa
Rita.
Atualmente
a vinícola é uma das maiores do país, com milhares de hectares espalhados pelas
principais regiões do Chile, possui sociedade com a argentina Viña Doña Paula e
marcante penetração nos mercados internacionais, inclusive o Brasil. Em sua
sede no Valle do Maipo, há um importante museu – Museo Andino – que possui
excepcional coleção de artefatos, objetos e registros históricos e
pré-históricos dos povos pré-colombianos no Chile, bem como uma infra-estrutura
excepcional, voltada ao enoturismo. Estando muito próximo à cidade de Santiago,
tornou-se naturalmente um dos principais pontos turísticos visitados do país.
A Hacienda de Paine – atual Hacienda
Santa Rita – nos dias de hoje.
O antigo porão onde os soldados
pró-independência se esconderam na Hacienda de Paine tornou-se o espaço para
degustação dos vinhos da Santa Rita, atualmente.
Entrada do Museo Andino, que contém
importante acervo pré-colombiano.
Santa Rita.
Degustação – Vinhos Santa Rita
O
Mundo e o Vinho esteve na vinícola Santa Rita no mês de Junho/2016 – sede
de Alto Jahuel, Valle do Maipo, onde, além de comprovar a riqueza histórica e o
cuidado da vinícola em sua produção, teve a oportunidade de degustar os vinhos
abaixo:
Vinho Degustado: Santa Rita Reserva
Sauvignon Blanc 2015
Análise
Visual:
Límpido e
de intensidade baixa em sua coloração, apresentou borda incolor e núcleo
amarelo palha;
Análise
Olfativa:
Aromas
apresentando alta intensidade, primários, contendo abacaxi e pimentão em
profusão, bem como o característico herbáceo desta cepa;
Análise
Gustativa:
Seco
e de acidez equilibrada, sabor intenso de abacaxi e muito herbal. Corpo médio,
álcool idem; persistência média para alta na boca.
Considerações
Finais:
Um
típico Sauvignon Blanc do Novo Mundo, bastante vivo e agradável: pronto para
beber. Ostras, petiscos à base de frutos do mar como sugestões de harmonização
ou mesmo solo.
Pontuação:
89 FRP
Vinho Degustado: Santa Rita Reserva
Carmenere 2013
Análise
Visual:
Límpido e
de intensidade média para alta em sua coloração, apresentou borda rubi e núcleo
rubi escuro na taça;
Análise
Olfativa:
Aromas
apresentando média intensidade, secundários, com muito defumado, frutas negras
maduras e baunilha;
Análise
Gustativa:
Seco,
possui acidez média e taninos médios para baixos; sabor de intensidade média,
defumado e frutas maduras. Elegante no corpo e no álcool, bem integrados, de
ótima persistência, de média para alta;
Considerações
Finais:
Um
bom Carmenere, com evolução por mais 4 anos, elegante e correto. Um pernil
assado ou risoto piemontês são sugestões de harmonização.
Pontuação:
92 FRP
Vinho Degustado: Santa Rita Medalla Real
Gran Reserva Cabernet Sauvignon 2012
Análise Visual:
Límpido e
de intensidade alta, apresenta borda rubi e núcleo rubi escuro;
Análise
Olfativa:
Aromas
de média intensidade, secundários, contemplando cedro, eucalipto e chocolate
amargo;
Análise
Gustativa:
Seco
e de acidez média, taninos médios para altos, sabor intenso remetendo a
chocolate amargo e frutas negras. Encorpado e de alcool equilibrado, muito
persistente.
Considerações
Finais:
Fino,
em franca evolução e imponente: um típico grande vinho chileno. Pode evoluir
entre 8 e 10 anos. Cortes bovinos suculentos e macios, aves de carne delicada e
cordeiro assado são boas companhias para este belo vinho.
Pontuação:
94 FRP
Fontes:
Viña Santa Rita:
Tão bom poder ler sobre um lugar que a gente ja visitou, adorei o texto esta bem esclarecedor e revela exatamente o que é a vinicola santa rita.
ResponderExcluirAmo vc
Olá, Cintia! Também adorei este nosso passeio, pois tudo o que fazemos sempre foi, sempre é e sempre será muito especial! Amo você!
ExcluirSaúde, e bons vinhos! (quando nosso enobaby permitir rs)
Muito interessante a história da vinícola, obrigado pela pesquisa e pela postagem.
ResponderExcluirEu particularmente gosto bastante dos vinhos da Santa Rita. Quando em Santiago não pude visitar a bodega, espero corrigir essa falha numa próxima oportunidade.
Saúde!
Olá, Edward! Recomendo e muito a visita à vinícola e toda a sua estrutura. Há muita história a ser aprendida, e grandes vinhos a degustar.
ExcluirObrigado pela audiência. Saúde, e bons vinhos!