Vinícola Ganz.
Em
um mundo aonde as mudanças climáticas, aos poucos, vêm redefinindo as áreas
cultiváveis, a descoberta de novas áreas atraentes ao plantio de Vitis Vinifera envolve até mesmo os
países os quais supostamente encontram-se com seus territórios “esgotados” em
termos de possibilidades. Territórios antes dominados pelo plantio de cepas
brancas tornam-se atrativos, aos poucos, ao plantio de cepas tintas.
Um
dos países mais “beneficiados” com esta nova situação é a Alemanha. Tradicional
produtora de vinhos brancos de altíssima qualidade, as alterações climáticas
vêm tornando seu território, especialmente ao sul, interessante para o cultivo
de cepas tintas mais resistentes ao frio. E, somado ao crescente interesse de
todos os produtores em produzir vinhos de qualidade, têm tornado tais regiões
um berço de interessantes rótulos, que exploram as novas possibilidades sem
abandonar os antigos cultivos, todos beneficiados pelo crescente desejo de
“reconquista” do prestígio do vinho germânico. Uma das líderes desse movimento
é a região de Pfalz.
Sua História
Pfalz
(ou Palatinado) foi povoada inicialmente por populações de origem celta. Por
volta de 12 a.C., sob o imperador Augusto, a região tornou-se parte da Germânia
Superior e sua população, “romanizada”. Séculos depois, no período de
decadência do Império, tribos alamanas (“bárbaras”) ali se estabeleceram, sendo
posteriormente conquistada por Clóvis, rei dos francos, em 496 (embrião do
futuro Sacro Império Romano-Germânico). Desde os romanos, aliás, uma cultura
vinícola foi estabelecida na região, utilizando-se de uvas trazidas por estes,
bem como variedades nativas.
Clóvis, Rei dos Francos (pintura de
François-Louis Dejuinne).
Até
1792, Pfalz permaneceu dividido em 45 territórios sob domínio da Igreja
Católica, alguns de dimensões muito pequenas. No final do século XII, a região
tinha alcançado o status de “Eleitorado”, tornando-se uma das sete regiões com
o privilégio de poder eleger o imperador. Em 1797, contudo, a região localizada
à margem esquerda do rio Reno foi anexada à França, então recém-saída de sua
revolução, tornando-se o Departamento francês de Mont Tonnerre. Essa região
englobava a maior parte do Palatinado, embora também houvessem partes de seu
antigo território englobadas nos Departamentos do Sarre e Baixo Reno, também
anexados à França.
Invasão dos exércitos
de Napoleão ao território alemão.
Em
1815 foi realizado o Congresso de Viena, reunião dos países europeus após a
deposição e exílio de Napoleão Bonaparte, o qual havia conquistado boa parte do
continente europeu no início do século XIX, com o intuito de tentar
restabelecer a antiga ordem política e divisão geográfica do continente. Desta
forma, Pfalz tornara-se novamente uma região soberana, porém vinculada ao
Império Austríaco. No entanto, no ano seguinte, foi assinado um tratado entre
este e a Baviera, onde o primeiro cedia diversos territórios ao segundo, entre
eles boa parte do Palatinado. Assim, Pfalz torna-se o oitavo distrito do então
Reino da Baviera. O distrito, então, passou a se chamar Rheinkreis, conforme regras da reorganização administrativa a qual
a Baviera havia acabado de passar. Logo, porém, com a posse do rei Ludwig I, os
distritos administrativos deveriam ser nomeados considerando seu passado
histórico, motivo pelo qual seu nome foi definitivamente alterado para Pfalz.
O Congresso de Viena.
Décadas
depois, em 1920, o Palatinado tornou-se “moeda de pagamento” dos alemães para a
Liga das Nações (embrião da futura ONU), em decorrência dos termos não
cumpridos por aqueles do Tratado de Versalhes, assinado por vencedores e
vencidos ao término da Primeira Guerra Mundial. Após revoltas separatistas na
região, esta tornou-se novamente parte integrante da Baviera, situação que se manteve
durante o regime nazista da Alemanha.
No
ano de 1934, foi registrada uma safra de uvas recorde na Alemanha, e a previsão
para o ano seguinte era igualmente otimista. Assim, em 1935, Gauleiter Josef
Burckel idealizou uma estrada que ligaria todas as regiões vinícolas alemãs, a
fim de impulsionar o comércio e o turismo. Assim, nascia a Deutsche Weinstraße, ou Rota do Vinho Alemão. No
entanto, seu trajeto encontra-se atualmente restrito às regiões de Pfalz e
Rheinhessen.
Portal do Vinho
Alemão: ponto de partida da Rota do Vinho Alemão, em Pfalz.
Após
a Segunda Guerra Mundial, a união do Palatinado com a Baviera foi dissolvida
com a ocupação “aliada”, tendo permanecido sob a área de ocupação francesa.
Estes reorganizaram a região, a qual foi agregada ao distrito de Rheinhessen,
formando o Estado da Renânia-Palatinado (Rheinland-Pfalz),
tendo sido este dissolvido em 2000. Embora a região produza ainda vinhos
simples, os quais tornaram-se a tônica da indústria alemã a partir do
Pós-Guerra, desde a promulgação da atual legislação alemã nos anos 1980 os
vinhos de toda Alemanha (notadamente Pfalz) vêm retomando o antigo prestígio,
atingindo alto nível de qualidade e preços consequentemente altos.
Sua Localização
Localização de
Rheinland-Pfalz no território alemão.
Pfalz
localiza-se a sudoeste do território alemão, na margem oeste do rio Reno, ao
norte da fronteira com a França e ao sul da região vinícola do Rheinhessen.
Possui uma área de cerca de 20.000 km². Sua capital é Mogúncia, e a população,
cerca de 4 milhões de habitantes.
Mapa vinícola da
Alemanha (Pfalz em azul-claro).
Seu Clima e Solo
Vinícola Heinz
Pfaffmann.
De
macroclima continental, Pfalz é uma região de clima suave e seco. Seus verões e
outonos são relativamente quentes, o que a torna propícia para o cultivo de
cepas nem sempre associadas à Alemanha. O principal motivo desse clima incomum
é a “proteção” fornecida pelas Montanhas Haardt, continuação natural dos
Vosges, localizados na Alsácia, França, cuja altura impede que frentes frias e
precipitações adentrem o sul do território alemão.
O
solo é essencialmente de origem vulcânica, misturado com arenito, marga,
calcário, argila. Também há “ilhas” de solos compostos essencialmente de
ardósia.
Suas Sub-Regiões
Vinícola Müller-Catoir.
Apesar
de seu diminuto tamanho, Pfalz é dividida em 16 sub-regiões, conforme abaixo:
- Bad Durkheim
- Birkweiler
- Burrweiler
- Deidesheim
- Forst an der Weinstrasse
- Gimmeldingen
- Godramstein
- Haardt
- Kallstadt
- Konigsbach
- Laumersheim
- Ruppertsberg
- Schweigen
- Siebeldingen
- Ungstein
- Wachenhei
Suas Castas
Ao
associarmos as palavras “Alemanha” e “vinho”, é natural imaginarmos as
charmosas garrafas no estilo “flute”, contendo vinhos brancos. É um fato, assim
como é um fato que, a despeito disso, Pfalz é a mais “vermelha” das regiões
alemãs. Cerca de 40% do vinho ali produzido é tinto.
Garrafa no formato Flute.
A
cepa predominante na região é a clássica Riesling, nativa do norte europeu. De
elevada acidez, amadurecimento tardio e longevidade na garrafa, possui grande
resistência aos climas frios da Alemanha, e pode dar origem a grandes vinhos
secos, como rótulos doces de elevada qualidade.
Riesling.
Do
lado “tinto”, a variedade predominante é a Dornfelder, cepa que não costuma dar
origem a grandes vinhos. Porém, costuma dar bons resultados quando envelhecida
em barricas novas.
Dornfelder.
Deve-se
mencionar, contudo, o crescente interesse alemão pela cepa tinta Pinot Noir (em
alemão, Spätburgunder), casta que vem
se tornando comum em Pfalz. De grande resistência a climas frios e origem de
vários “clones”, esta cepa de origem francesa (Borgonha) depende muito do terroir em que é cultivada para
expressar os seus aromas e sabores. Sua qualidade, apesar de crescente, é ainda
discutível na maior parte das áreas de cultivo. Em Pfalz (e na Alemanha em
geral) têm sido obtidos bons resultados com esta cepa, porém ainda distantes do
nível atingido em sua terra natal.
Pinot Noir.
Também
são cultivadas em Pfalz a cepa tinta Portugieser e as brancas Pinot Blanc,
Gewurztraminer, Müller-Thurgau (origem dos famosos Liebfraumilch, “vinhos da
garrafa azul”, como eram conhecidos popularmente no Brasil – porém estes são
produzidos, sobretudo, na vizinha Rheinhessen) e Pinot Gris.
Seus Principais Produtores
Segue
lista de alguns produtores de destaque da região de Pfalz:
- Klaus Neckerauer;
- Werle;
- J.F. Kimich;
- Kurt Darting;
- Eugen Müller;
- Weingut Müller Catoir;
- Weingut K & H;
- Lingenfelder;
- Bürklin-Wolf;
- Weingut Kloster Heilsbruck;
- Schloss Wachenheim;
- Weingut Heinz Pfaffmann;
- Weingut Gries.
Vinho Degustado: Pfaffmann Riesling QbA 2013
A Heinz Pfaffmann é uma tradicional
vinícola, fundada em 1616, ou seja, com 400 anos de idade. Após 17 gerações, a
já quase centenária matriarca, Emma Pfaffmann, até hoje faz questão de colher
as uvas utilizadas em seus vinhos de estilo Auslese e Spätlese (grosso modo,
secos com algum dulçor). O rótulo avaliado é um QbA (Qualitätswein Bestimmter
Anbaugebiete), denominação equivalente ao IGP utilizado na União Européia.
Análise Visual:
Límpido, de baixa intensidade na coloração,
borda incolor, núcleo palha com um tom esverdeado;
Análise Olfativa:
Aroma de média para alta intensidade,
predominantemente primário, mineral, algo petrolífero, frutas brancas;
Análise Gustativa:
Meio seco, de alta acidez, sabor de alta
intensidade, com forte mineral, fruta branca; corpo médio, álcool idem,
persistência média para alta.
Considerações
Finais:
Fresco, típico da cepa, gostoso. A beber
solo ou acompanhado de ostras frescas e saladas.
Pontuação: 90 FRP
Vinho Degustado: Heinz Pfaffmann Riesling Trocken
2012
Análise Visual:
Límpido, de média intensidade, de
borda incolor e núcleo amarelo palha, pendendo para o dourado;
Análise Olfativa:
Aromas de média intensidade,
primários, bastante mineral e frutas brancas, com notas cítricas;
Análise Gustativa:
Seco, de acidez média para alta,
sabor de média intensidade, remetendo a frutas secas. Médio corpo, alcool discreto;
persistencia alta.
Considerações Finais:
Delicado e altivo, classudo.
Acompanha aves grelhadas, frutos do mar e carnes suínas leves. Excelente vinho.
Pontuação: 92 FRP
Bibliografia:
LAROUSSE, Larousse
do Vinho, 2007. Larousse do Brasil.