Fala-se,
frequentemente (na verdade, o verbo acusa-se é mais correto) na
“internacionalização” do vinho sul-americano. Por internacionalização
entende-se o direcionamento do perfil dos rótulos produzidos a fim de atender o
mercado consumidor europeu e norte-americano, seus principais compradores.
Trata-se de uma meia-verdade: realmente, o viés financeiro têm sua parcela de
responsabilidade. No entanto, o perfil do enófilo sul-americano e suas
preferências também buscam referência no Velho Mundo. Não se trata, no entanto,
de algo ruim: a Europa é um mosaico de cepas, estilos, terroirs que, aos
poucos, vêm tentando ser refletidos e adaptados aos solos e microclimas
sul-americanos, muitas vezes com sucesso. Um desses “casos” de sucesso, sem
dúvida, é a Lapostolle que, como o próprio slogan diz, é francesa em sua
essência, porém chilena de nascimento.
O Produtor
Vinhedos da Lapostolle no Vale de
Apalta, microrregião localizada no Vale de Colchagua, Chile.
A
Lapostolle foi fundada no ano de 1994, pelos franceses Alexandra Marnier
Lapostolle e Cyril de Bournet, seu marido, em conjunto com o chileno José Rabat
Gorchs. Alexandra é a herdeira natural do patrimônio da família
Marnier-Lapostolle, criadores do famoso licor Grand Marnier.
Licor Grand Marnier.
Além
da produção de licores, a família já possuía reputação com seus vinhos no Velho
Mundo, porém desejava explorar os terroirs sul-americanos, então em voga
entre os apreciadores de vinho. A opção inicial de Alexandra era por Mendoza,
na Argentina. No entanto, as travas aduaneiras impostas pelo governo argentino
à época a desestimularam, e a futura vinícola Lapostolle viria a instalar-se no
Vale de Colchagua, no Chile, região que já demonstrara seu potencial para a
produção de conceituados vinhos, os quais viriam no futuro a serem denominados superchilenos.
O
infortúnio propiciado pela Argentina aos planos dos Lapostolle não poderia ter
sido mais oportuno: foi adquirida uma área no chamado Vale de Apalta, dentro de
Colchagua. Os microclimas ali existentes são considerados ideais para a
produção de vinhos tintos de excepcional qualidade, em geral de perfil robusto
e de guarda. Some-se ao fato de que a família não poupou recursos para explorar
ao máximo as peculiaridades do terroir: o renomado e experiente enólogo
francês Michel Rolland foi contratado como consultor da jovem vinícola. Como
atestado da grandiosidade do projeto de Alexandra, foi construida uma imponente
sede, cuja arquitetura assinada pelo chileno Roberto Benavente simboliza o
ciclo da vida de um vinho, e os setores dos seus andares obedecem a este
conceito.
Michel Rolland, enólogo francês,
consultor da Lapostolle até os dias atuais.
Não
tardaria para os primeiros frutos serem colhidos: em 2003, menos de 10 anos
após a sua fundação, o seu principal vinho, o Clos Apalta (safra 2000) obteria
a terceira colocação no Top 100 da prestigiosa Wine Spectator.
Cinco anos depois, em 2008, a safra 2005 do vinho homônimo foi eleito o “Vinho
do Ano” pela mesma publicação, atingindo a pontuação mais elevada já dada pela Wine
Spectator a um vinho sul-americano (96 pontos).
Atualmente,
a Lapostolle possui, além do vinhedo de Apalta (exclusivo para a produção do
icônico Clos Apalta e de seu outro superchileno, o Borobo – vinho de
produção limitadíssima, criação exclusiva de Michel Rolland) vinhedos no Vale
de Casablanca, no vizinho Vale de Cachapoal e em Cauquenes, no Vale do Maule.
Sua linha inclui, além dos vinhos já citados, os rótulos Casa, Le Rosé,
Canto de Apalta e Cuvée Alexandre, produtos constantemente alvo de
premiações em concursos internacionais. O blog esteve recentemente na sede do Vale de Apalta, onde participou de uma degustação a qual incluiu as linhas Casa (Sauvignon Blanc), Cuvée Alexandre (Merlot) e Clos Apalta (blend de uvas tintas) - veja abaixo - e pode atestar o esmero e refinamento dedicados à produção dos seus vinhos.
Detalhe interno da sede da vinícola
no Vale de Apalta, cujo ciclo em espiral simboliza o ciclo da vida de um vinho.
Sala de degustação da sede do Vale
de Apalta.
Seu Legado
Detalhe da
sede da vinícola no Vale de Apalta, com este ao fundo. As colunas de madeira,
24 no total, simbolizam a quantidade de meses que o seu principal vinho (o Clos
Apalta, ali produzido) passa em repouso nas barricas de carvalho, antes de ser
lançado.
Certamente
o Chile possui alguns dos terroirs do chamado “Novo Mundo” mais próximos
do que foi a Europa antes do avanço da filoxera. Naturalmente, seu território
tornou-se palco do surgimento de rótulos com potencial para desbancar, em
concursos, algumas das “estrelas” européias. Ao levar “ao extremo” a aplicação
das técnicas européias em território sul-americano e contribuir de forma
decisiva para o estrelato dos vinhos chilenos, esse talvez seja o maior legado deixado
pela vinícola, confirmando em definitivo que, sim, a América do Sul pode
desempenhar papel de protagonista no mundo do vinho.
Lapostolle.
Vinho Degustado: Lapostolle Casa Grand
Selection Sauvignon Blanc 2015
Análise
Visual:
Límpido e
de intensidade baixa, apresentou borda incolor e núcleo amarelo palha;
Análise
Olfativa:
Aromas
apresentando média intensidade, primários, contendo abacaxi e maracujá em
profusão; leve herbáceo;
Análise
Gustativa:
Seco
e de acidez equilibrada, sabor intenso de abacaxi, maracujá e muito herbal.
Corpo médio para baixo, álcool idem; persistência média.
Considerações
Finais:
Com
certa elegância para um Sauvignon Blanc, de boa tipicidade de cepa e região:
pronto para beber. Ostras, petiscos a base de carne branca e salada caprese são
sugestões de harmonização.
Pontuação:
90 FRP
Vinho Degustado: Lapostolle Cuvée
Alexandre Merlot 2013
Análise
Visual:
Límpido e
de intensidade média em sua coloração, apresentou borda rubi clara e núcleo
rubi;
Análise
Olfativa:
Aromas
apresentando média intensidade, secundários, com boa baunilha, tostado e fruta
negra madura;
Análise
Gustativa:
Seco,
possui acidez média para baixa e taninos destacados; sabor de intensidade média
para alta, defumado, com fruta compotada e café. Elegante no corpo e no álcool,
de ótima persistência.
Considerações
Finais:
Típico
quanto à cepa, bordalês, fino: pode ser bebido agora ou guardar por cerca de 3
anos. Cordeiro assado, javali, risoto milanês são sugestões de harmonização.
Pontuação:
92 FRP
Vinho Degustado: Lapostolle Clos Apalta
2011 (Carmenère, Cabernet Sauvignon e Merlot)
Análise
Visual:
Límpido e
de intensidade alta, apresenta borda rubi e nucleo rubi escuro;
Análise
Olfativa:
Aromas
de média a alta intensidade, de caráter terciário, contemplando couro, resina,
especiarias, tostado e alguma fruta negra;
Análise
Gustativa:
Seco
e de acidez média para baixa, taninos austeros e elegantes, seu sabor é de alta
intensidade, remetendo a fruta negra madura ainda com algum frescor e um toque
defumado e de especiarias. Encorpado e de álcool de intensidade média para
alta, muito persistente na boca.
Considerações
Finais:
Poderoso,
elegante, complexo aromaticamente e de excepcional evolução: pode ser bebido ou
guardado por um bom tempo. Javali assado, cordeiro e aves de carne mais encorpada
são sugestões de harmonização.
Pontuação:
96 FRP
Fontes:
Lapostolle: